Peso de ouro

11 Sep 2014

Como o cenário macroeconômico convergiu para um excepcional momento para produtores de proteína animal

Em 2014, a perspectiva por um acréscimo sensível no consumo de carnes vermelhas no Brasil  - em decorrência da Copa do Mundo e da injeção de dinheiro na economia pelas eleições  - não se concretizou. No entanto, foi neste ano que se consolidou o alicerce para a “Era de Ouro” da proteína animal para o produtor brasileiro. Isso ocorre porque uma série de fatores benéficos para os criadores aconteceu ao mesmo tempo:

- Preço dos grãos em queda;
- Retenção de matrizes nos Brasil e nos EUA;
- Seca e redução de rebanho na Austrália;
- Demanda aquecida no exterior;
- Embargo dos Estados Unidos e da Europa para a Rússia.

O “alinhamento dos astros” da pecuária de corte ocorre após um ciclo de margens positivas para os produtores de grãos, que pode ser encerrado com a colheita de boas safras na Ásia, América Latina e Estados Unidos, recompondo os estoques mundiais. A leitura foi feita na noite da última terça-feira, 9, pelo economista Alexandre Mendonça de Barros, da MB Consultoria. Barros esteve em Campo Grande, capital do MS, para participar de evento realizado pela Macal, empresa de nutrição animal, na ocasião do lançamento de seu novo posicionamento, “Inteligência técnica que gera lucratividade”.

Leia os principais tópicos deste artigo:

O novo ciclo Mercado brasileiro Grãos, suplementação a pasto e confinamento Aves e suínos Cana-de-açúcar e política Investimentos

O novo ciclo
Em sua apresentação, Barros lembra que o cenário começou a ser desenhado ainda em 2008, quando ocorreu a crise mundial. Com menor poder aquisitivo, a população norte-americana diminuiu o consumo de carnes vermelhas em 10%, algo inédito na história do país. Somando este fator à seca nas regiões de cria, houve uma consequente redução de rebanho no país. Atualmente, os EUA têm o menor rebanho dos últimos 63 anos, entre 87 e 88 milhões de cabeças. O rebanho de vacas e novilhas (38 milhões) é o menor em 73 anos, enquanto o de bezerros é o menor em 60 anos. Se forem contabilizadas somente as vacas, é o menor em 50 anos.

“A primeira mensagem é: o gado americano encolheu, seja porque o grão ficou caro ou houve seca nas áreas de cria, forçando abate. O preço da arroba atingiu o recorde histórico nominal de US$ 103 e tem rodado nas últimas semanas entre US$ 96 e US$ 97. Não tem oferta. É um forte ciclo de retenção de gado. Este ciclo é regular e dura quatro anos”, assegura o economista. Os próprios especialistas dos EUA afirmam que este é o maior desequilíbrio de sua pecuária de corte em 100 anos. Por isso, em 2014 é esperada uma queda de 4,5% da produção de carne, o que torna os EUA importadores líquidos ao invés de exportadores, afinal, com os sinais de retomada da economia, o consumo interno americano deve voltar aos níveis normais.

A seca atingiu também a Austrália. O rebanho diminuiu por conta de abates e embarque de gado em pé pela falta de alimento. Para o ano de 2015, o país projeta diminuição de um milhão de cabeças abatidas, fazendo com que as exportações sofram queda de até 300 mil toneladas, prejudicando o ávido mercado chinês, que já recuou quanto ao embargo à carne brasileira. “Nós já estamos também batendo no limite da capacidade de exportações. Estados Unidos e Austrália também estão recuando. A Índia bate em seu teto, mas de toda forma não tem o mesmo mercado que o brasileiro por conta da inferior qualidade de carne. É muito raro o que está acontecendo, ou seja, sincronizar retenção de fêmeas nos três maiores produtores e exportadores, claro, tirando a Índia, que é caso à parte”, contextualizou Alexandre Mendonça de Barros.

Rebanho bovino dos Estados Unidos

Categoria Redução
Bezerros Menor em 60 anos
Vacas e novilhas 38 milhões de cabeças (menor em 73 anos)
Vacas Menor em 50 anos
Total Entre 87 e 88 milhõs de cabeças (menor em 63 anos)

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Mercado brasileiro
No Brasil, já há indícios de retenção de matrizes. Em 2013, o país registrou seu maior abate da história, situação que perdurou até o começo de 2014. Com uma demanda externa forte, as indústrias diminuíram o spread entre boi gordo e vaca gorda. “Isso forçou abate de fêmeas mesmo com o bezerro em alta. Não é para sempre, porque quando o preço do bezerro explode, não tem jeito. Então foi uma missão meio suicida da indústria, porque consegue manter-se no curto prazo, no longo falta matéria-prima”, analisou o economista.

A expectativa do consultor para valorização do preço da arroba tem teto perto de R$ 130,00. Barros explica que, analisando momentos similares do passado, o teto do preço do dianteiro no atacado sempre esteve próximo dos R$ 7,00, recuando a partir daí. Neste momento, o mercado já paga próximo dos R$ 7,00 no dianteiro. Além disso, o spread entre o dianteiro e a carne de frango, que é a principal concorrente no Brasil, está em um de seus maiores níveis dos últimos anos e tende a diminuir. “Para pagar uma arroba de R$ 150, a indústria teria que buscar R$ 8,00 no dianteiro no atacado. Então, para mim, o boi chega a R$ 128,00 ou R$ 130,00. Onde eu posso estar errado para haver valorização maior que essa? Se a exportação tiver demanda muito mais aquecida”, ponderou.

Com redução nas produções norte-americana e australiana de carne, além do embargo, este é um cenário que pode acontecer, com Rússia e China voltando olhos para o Brasil. Outro fator que pode fazer o mercado se abrir para a carne brasileira é a aprovação dos EUA para a entrada de nossa carne. “Não é pelas 60 mil toneladas, mas o que representa para Japão, México e outros mercados em termos de status sanitário. Só assim poderia aumentar, também, a nossa produção de carnes premium”, pensa Alexandre Mendonça de Barros.

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Grãos, suplementação a pasto e confinamento
Suplementação mineral proteica para bovinosEm 2010, com o preço da arroba a R$ 70,00 e boas condições de pasto, o pecuarista brasileiro pôde segurar o animal, o que fez, junto com outros fatores, a arroba custar até R$ 115,00 para a indústria. Na época, a relação de troca boi gordo / bezerro chegou ao auge de 2,6, quando os produtores começaram a vender boi e comprar bezerro, que com o tempo se valorizou e girou novamente o ciclo, voltando a relação para 2,2. Situação semelhante pode ocorrer nos próximos meses. Se houver condições de pasto e, em situações pontuais, com o preço dos grãos em baixa, é possível a retenção de gado e a suplementação a pasto, exemplificou Barros. Segundo o consultor, para 2015, é possível até prever aumento do volume de gado confinado. Atualmente, a relação de troca gira em torno de 1,8.

Sobre a decisão entre farelo de soja e milho, Alexandre Mendonça de Barros aconselha: “é um bom momento parar comprar milho. Eu ficaria curto em farelo e compraria milho. Tem boas chances de milho começar 2015 com estoques altos e permanecer com preço baixo”. O economista explica que, embora haja previsões excelentes de safra de soja, os estoques norte-americanos ainda estão baixos, já que a nova safra ainda está por vir. No Brasil, a nova safra só começa a ser colhida em fevereiro, então o preço do farelo deve se sustentar até este período.

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Já para o milho, com exportações em baixa, os estoques devem romper 2015 em alta, mantendo preços baixos e favorecendo avicultores, suinocultores e pecuaristas de corte e de leite. “De toda forma, eu faço ressalvas para os produtores ligarem o sinal amarelo e ficarem atentos. “Este é o menor plantio de primeira safra de milho história do Brasil. Caiu cerca de 20% em área. Se romper o ano com estoque alto e preço baixo, isso desestimula também o plantio de safrinha. Então, no ano que vem, precisamos ficar espertos”, avisa.

Exportação de milho no Brasil: embarques devem ganhar força a partir de agosto

Área cultivada no verão deve ser menor, com milho perdendo espaço para soja

Outro fator que pode mudar drasticamente o mercado de milho são os dados imprecisos da China, que ora anuncia a maior safra da história (cerca de 220 milhões de toneladas), com confirmação, inclusive, do USDA, ora anuncia a pior safra em 50 décadas para algumas províncias por conta da seca. “Mas isso não deve acontecer. Estamos acompanhando de perto e, aparentemente, a produtividade das áreas que têm boa disponibilidade de água devem compensar o fraco desempenho de outras”, rejeita o economista da MB Consultoria. Além das previsões de ótimas safras, no mercado futuro a maior parte dos fundos está vendida, apostando na queda de preços.

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Aves e suínos
aves e suínosNo mercado brasileiro, há motivos para os dois setores comemorarem. Na avicultura, a Abef (Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango) estima embarque de 150 mil toneladas de carne para a Rússia nos próximos três meses. No ano passado inteiro, o Brasil havia enviado aos russos 47 mil toneladas.

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A Rússia irá interferir também na suinocultura. A Europa, que anunciou recentemente embargo ao país, havia mandado no ano passado 500 mil toneladas de carne suína, enquanto o Brasil embarcou 120 mil, volume que deverá ser superior em 2014, visto que o Brasil desponta como única alternativa. Além disso, mesmo que não houvesse anunciado bloqueio econômico, os EUA poderiam não atender à demanda por conta da redução de rebanho provocada pela diarreia epidêmica. Embora as autoridades digam que o problema está controlado, especialistas apostam na volta da doença na estação fria.

Suinocultores veem descolamento dos preços do animal x preços dos grãos

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Setor sucroenergético e política
Quanto ao setor produtivo da cana-de-açúcar, Barros reforça que indústria e agricultores sofrem com momento de preços defasados. “Mas a onda já está virando, embora as pessoas ainda não acreditem. Dependendo de quem ganhar a eleição presidencial, o mercado pode virar muito mais rápido”, afirma.

Se por um lado o economista acredita em mudança brusca no setor sucroenergético de acordo com o resultado das eleições, ainda há pontos de interrogação em relação a outras demandas do agronegócio. “A gente consegue ver na oposição um posicionamento favorável ao setor sucroalcooleiro, mas há dúvidas sobre a parte ambiental e regulação de novas tecnologias. Então surgem grandes perguntas e dúvidas. Se do lado macroenômico parece mais clara a postura dos candidatos, na parte setorial não é tão previsível. De toda forma, o momento da situação é muito ruim para o setor sucroalcooleiro. A gente já sabe o que acontece se a situação continuar. A parte de política econômica foi muito ruim nesses últimos anos”, argumenta.

Flexibilização produtiva: diversificação é saída para crise sucroalcooleira

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Novos investimentos
Alexandre aponta que a retração dos investimentos no Brasil é uma das grandes causas da recessão econômica do país. “Sempre que há mudança, não é hora de se apostar cegamente. As eleições não estão definidas, pois novas informações podem conturbar a corrida presidencial. A taxa de investimento despencou, o que trouxe o PIB para baixo. Ninguém vê o que vem pela frente”, ressalta. “Mas do ponto de vista pecuária, só se eu estiver muito errado, mas é difícil não ser um cenário espetacular. Vamos viver a fase de ouro da pecuária. É muito difícil ver os astros se alinharem da maneira como estão alinhados. A gente já notava essa onda e ela chegou. Nós vamos surfar”, conclui Barros.

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Primeira foto em destaque: Divulgação / Novilho Precoce MS

Fonte: José Luiz Alves Neto / Rural Centro



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