Pecuária nos Estados Unidos e no Brasil: quais as diferenças?

16 Oct 2012
No fim do mês passado um grupo de pecuaristas da Associação Sul-mato-grossense de Produtores de Novilho Precoce esteve nos Estados Unidos para visitar instalações do frigorífico JBS e conhecer o sistema produtivo de fazendas e confinamentos do país, que tem o terceiro maior rebanho e é o maior produtor de carne bovina do mundo devido à alta taxa de desfrute. A excursão dos brasileiros passou pelas cidades de Denver e Greeley (Colorado) e Amarillo, Cactus e Dallas (Texas). Para o diretor presidente da Novilho Precoce MS, o pecuarista Alexandre Scaff Raffi, o ponto mais interessante foi a visita à NCBA, National Cattlemen’s Beef Association, ou Associação Nacional de Pecuaristas de Corte, em tradução livre. A entidade tem 27 mil associados e fatura mais de US$ 90 milhões por ano, dos quais US$ 20 a 25 milhões são utilizados em marketing para a cadeia produtiva e o consumo de carne bovina.
Os pecuaristas brasileiros foram escolhidos para a viagem por terem sido premiados pelo Show da Carcaça 2012. Eles conheceram ao todo dois confinamentos e três propriedades, além do frigorífico JBS. “A integração do produtor com o frigorífico é muito maior que no Brasil. Pelo que nós vimos, (o JBS) é um frigorífico que abate cinco mil cabeças por dia, praticamente todas confinadas, e a maioria dos produtores vende bezerro pros frigoríficos, que fazem a engorda própria”, relatou Alexandre Raffi.
- Veja mais características dos frigoríficos dos EUA
Pelo custo alto de produção (US$ 1,37 a libra do bezerro - cerca de US$ 3,014 ou R$ 6,13 por quilo - e US$1,17 a libra do boi gordo – US$ 2,57 ou R$ 5,23 o quilo), os pequenos confinadores estão abrindo espaço para que os grandes dominem o mercado pelo grande volume com que trabalham. Os custos elevados não são culpa exclusiva do preço dos grãos, mas do sistema produtivo que agrega muita tecnologia à produção de carne. “A pecuária é extremamente extensiva porque não chove, as pastagens são nativas e eles ocupam em média 10 hectares por vaca. No Texas chove 300 milímetros por ano, no Colorado chove menos que no Texas”, conta Raffi.
No uso da tecnologia está embutida a irrigação por pivô central, usado por todas as propriedades, como ressalta o diretor presidente da Novilho Precoce MS. “Uma das fazendas que visitamos tem 1800 hectares e 18 pivôs, cada um com um poço artesiano”, complementa. Assim, a pecuária tem um perfil feito por animais de grande potencial genético (basicamente da raça angus), com capacidade para ganhar até 2,2 quilos por dia com silagem feita embaixo de pivô central, e são abatidos com 700 a 750 kg. O tipo de carcaça atende a uma demanda específica tanto dos japoneses como dos americanos. “Tem um mix de 50% de carne 50% de gordura usado para hambúrguer, por exemplo. Outro ponto é que o contrafilé deles é perfeito, com gordura entremeada”, ressalta Alexandre.
Comparação entre a carcaça bovina nos EUA e no Brasil | |
Contrafilé demonstrado pela área de olho de lombo![]() |
Contrafilé pronto para o consumo (Ribeye)![]() |
Na dieta dos animais, além do milho (usado no formato de grão, de resíduo que sobra do processamento para fazer etanol ou extrusado - corn flakes), são utilizados beta-agonistas (que possibilitam a engorda de até uma arroba nos últimos 30 dias de confinamento), hormônio e gordura animal certificados pelo USDA (Departamento de Agricultura dos EUA). O objetivo é atenuar a queda do rebanho, abatendo animais mais pesados. Na fase da terminação, o período de confinamento chega a 160 dias, enquanto a média no Brasil é 70 a 90 dias. O bezerro é desmamado por volta de 10 meses, já consumindo ração,vai direto para o cocho e são abatidos como dente de leite (precoce). O cocho, aliás, fica sempre cheio de comida, pois as condições climáticas de frio e escassez de chuvas permitem que o alimento permaneça no cocho por horas sem que haja fermentação. “Não importa a conversão. Enquanto o animal estiver comendo, ele fica confinado”, detalha o diretor presidente da Novilho Precoce MS. No inverno, alguns pecuaristas utilizam silagem de trigo.
Características das fazendas
Segundo a NCBA, os pecuaristas associados produzem em média 30 cabeças por ano. Muito pouco? O diretor presidente da Novilho Precoce MS lembra que existem muitas fontes de renda alternativa, como a própria agricultura, produção de feno, extração de gás ou petróleo de seu subsolo (que pertence ao proprietário e não ao governo), e a proximidade das cidades faz com que a família possa ter renda facilmente.
A aplicação de tecnologia reduz a demanda por mão-de-obra, já que o maquinário sempre novo e a automação exigem poucos ou nenhum funcionário. Como a média de produção é de 30 cabeças por pecuarista ao ano e as vacas são criadas em 10 hectares cada uma, o tamanho médio das propriedades é 300 hectares. Em geral, os pecuaristas focam em animais derivados de cruza com angus e, quem cria o bezerro geralmente vende para os confinamentos de grandes frigoríficos pelos elevados custos de produção.
Um exemplo de fazenda que os produtores da Novilho Precoce MS visitaram tem 1400 hectares, 890 destinados à agricultura, tudo irrigado. A agricultura de sequeiro é feita somente em 40 hectares. A produtividade é de 16 toneladas de milho por hectare, que se transformam em um ingrediente de excelente qualidade para silagem. “Talvez aqui nosso custo ambiental seja muito mais tranquilo. Sempre contamos aqui que leva 15 mil litros de água para produzir um bife. Aqui no Brasil, a gente aproveita esses 15 mil litros que vêm da chuva, senão essa água vai embora. No centro dos EUA, com 300 mm de pluviosidade ao ano, essa água tem que ser tirada do lençol freático, então se queimar uma bomba artesiana tem que ter outra no lugar. O custo de produção é alto, assim como o custo ambiental, mas com uma carne de alta qualidade. Não tem gosto de ração, é macia, pois os animais são abatidos com 25 arrobas com menos de dois anos”, sintetiza Raffi.
Com tanta tecnologia utilizada nos EUA e a abundância de recursos naturais no Brasil, é possível afirmar que o mercado de carne bovina dos norte-americanos irá se cruzar com o brasileiro? “Acho que não porque eles praticamente consomem o que produzem. Então eu penso que o certo é o meio termo – a gente avançar um pouco na tecnologia e eles diminuírem o uso pelo risco do alto custo”, resume Alexandre Raffi. E mesmo com o período de seca, o pecuarista brasileiro tira o chapéu para a força da economia americana. “Não vimos crise. Pelo contrário, muita gente de fora indo trabalhar pra sustentar um mercado forte, com restaurantes lotados e carros novos nos estacionamentos”, impressionou-se Alexandre.
Fotos: Divulgação / Novilho Precoce MS
Características do funcionamento do frigorífico nos EUA
- Animais vão para o abate poucas horas após chegarem e nunca esperam de um dia para o outro no curral;
- À parte a administração, a mão-de-obra é imigrante e pouco fidelizada, ou seja, 70% dos funcionários não ficam mais de um ano trabalhando nas plantas;
- Sistema eficaz matança, desossa e embalagem;
- Abate em média de 375 animais por hora.
Fonte: José Luiz Alves Neto / Rural Centro